Artigo: O problema de inflar o radicalismo religioso no mundo
Para ser claro, o ataque do Hamas é terrorismo, o cerco total de Israel é crime de guerra, um não anula o outro. Os ataques terroristas do Hamas à Israel mascaram vários problemas ocorridos anteriormente na região. Para além da já conhecida disputa de territórios e narrativas, do cerco e a chamada “prisão ao céu aberto” que acontece na Palestina, também gera a reação do corte de recursos básicos para sobrevivência aos habitantes palestinos.
Passada esta introdução, chama a atenção que um é produto do outro. No desejo de conquistar mais e mais território na faixa de Gaza, Israel apoia os partidos da Irmandade Muçulmana para dar contrapeso na disputa contra a Organização de Libertação da Palestina (OLP) e seu principal partido, o Fatah.
O Hamas se torna inimigo de Israel durante a partir da década de 80 e do primeiro levante em Gaza (1987), se recusando a aceitar a existência do Estado de Israel, além da prisão de seu líder, em 1984. A partir disso e da consolidação do acordo de paz da ONU em 1993, a OLP deixa de ser inimiga de Israel, e o Hamas, mais ideológico e religioso do que nunca, assume o papel de opositor à existência de Israel.
Guerras religiosas são frequentes e ocorrem pelo mundo. Algumas são impulsionadas por países apoiando grupos extremistas para derrubar opositores, até a hora que saem do controle e fomentam grupos armados, com dinheiro e conexões pelo mundo. Talvez o caso mais claro seja o de Osama Bin Laden.
Temos casos de guerras entre religiões, e outras dessas contra estados-nação. Protestantes contra a monarquia católica dos Habsburgos, da Igreja Católica contra o protestantismo e a guerra dos trinta anos.
Não é de hoje o conflito religioso, porém atualmente se destaca pelo ceifamento de direitos já conquistados. Reparem na volta do Talibã ao Afeganistão, que retoma a sharia que desde 2001 estava ausente no pais, ou na Nigeria que desde 2002 sofre com o Boko Haram e a briga entre muçulmanos e cristãos, até na Índia com o conflito hinduísta.
O ressurgimento das tensões religiosas em diversas esferas globais ressalta a imperatividade de um Estado voltado para a convivência entre todas religições, um pilar para a preservação dos direitos arduamente conquistados e a promoção de uma coexistência pacífica entre os diversos matizes sociais.
O Brasil, imerso em suas próprias querelas religiosas recentes, reflete um microcosmo deste cenário global, com a evangelização de indígenas, com a tentativa de revogação do casamento civíl homoafetivo. A escalada conservadora, impulsionada por uma confusão religiosa, desvela a periculosidade inerente a uma falta de separação entre Estado e Religião, culminando em conflitos diretos embasados em visões de mundo restritas, em detrimento de um cuidado inclusivo e equitativo.
Diante deste panorama, urge uma reflexão profunda da comunidade internacional e das sociedades, visando abordar o radicalismo religioso de maneira mais eficaz, fomentando a tolerância, o diálogo inter-religioso e a resolução pacífica de conflitos, almejando a construção de um futuro mais seguro e inclusivo para todos os habitantes deste globo.
Deixar que o Brasil tome um caminho de retrocesso de direitos compatível com os Estados Unidos e seu direito religioso, de revogar o irrevogável, de acabar com conquistas progressistas que levam até uma sociedade justa, movimentos tão absurdos quanto seria ter uma guerra santa hoje. Quando existe apenas uma religião no governo os demais se tornam hereges.